SAFE e Convertible Note: Recebendo investimento sem definir o Valuation

Introdução:

Uma das grandes dificuldades encontradas pelos fundadores de startups em estágio inicial (“early stage”) no momento de buscar investimentos é definir o valuation da empresa e qual percentual de participação societária poderá ser ofertado para os investidores.

Visando solucionar esse problema, surgiu nos Estados Unidos os SAFEs (simple agreement for future equity ou acordo simples para ações futuras) e as Convertible Notes (ou notas conversíveis), que são formas de investimentos não precificados que vem ganhando cada vez mais espaço entre empreendedores e investidores no Brasil.

O que são rodadas de investimentos não precificadas?

Antes de abordar especificamente sobre os SAFEs e as Convertible Notes, é importante explicar o que são as rodadas de investimentos não precificadas. 

As rodadas de investimentos não precificadas são formas de captação de investimentos sem estabelecer uma definição do valor da empresa (“valuation”) no momento da captação, oferecendo outras formas de garantias para os investidores que assumem esse risco.

Nessa forma de captação, não são oferecidos aos investidores um percentual de participação societária imediatamente. O investimento somente será convertido em equity para os investidores quando a startup for precificada na próxima rodada de investimento, oferecendo, geralmente, um desconto no preço por ação ou um teto no valor da empresa que será usado para precificar o valor aportado pelo investidor, a fim de compensar o risco assumido pelos investidores que aportaram na empresa sem um valor definido.

As rodadas não precificadas conseguem agilizar a captação de investimentos, visto que uma das partes mais complexas, que é a definição do valuation, é postergada para a próxima rodada. Elas também ajudam a diminuir os custos com despesas jurídicas para os investidores e possibilitam que haja uma precificação mais adequada da empresa em momento oportuno.

No entanto, o principal ponto de atenção é que, em razão de não saberem o valuation da empresa, as partes não conseguem saber exatamente qual o percentual da empresa está sendo diluído naquela rodada de investimento.

O que são SAFE (Simple Agreements for Future Equity)?

SAFE, sigla para “Simple Agreements for Future Equity”, que pode ser traduzido para o português como “acordo simples para ações futuras”, ou em tradução livre “Contrato Simples para Participação Societária Futura”, é uma forma de comprar participação societária cujo percentual será definido no futuro. Temos um vídeo no Youtube em que falamos exclusivamente sobre o SAFE.

Este instrumento foi criado em 2013 pela empresa americana Y Combinator, considerada uma das principais aceleradoras americanas, buscando acelerar o financiamento para startups em fase inicial. Inclusive, a YC disponibiliza diferentes versões do SAFE em seu site.

Por ser estruturado como um contrato, o SAFE não possui taxa de juros, diferentemente das Convertible Notes, e, assim como nas Convertible Notes, pode ser convertido em qualquer rodada de investimentos precificada e oferecer um desconto na conversão do contrato em ações da empresa, além de também ter geralmente um Valuation Cap.

Além disso, o SAFE é considerado um instrumento de equity, diferentemente das Convertible Notes e do Mútuo Conversível, o que implica em não possuir uma data de maturação, nem  taxa de juros.

A grande diferença do SAFE para o contrato de mútuo conversível tradicional, que é o contrato mais utilizado pelas startups no Brasil quando vão formalizar investimentos, é que para a realização do SAFE não é preciso saber o valor da empresa, nem o percentual societário a ser oferecido ao investidor no momento do investimento. 

Por fim, o SAFE é um documento ainda não difundido no Brasil pela dificuldade de se instrumentalizar ele na parte contábil de uma startup. Por não ter característica de um empréstimo, como o Mútuo conversível, o valor recebido pelo SAFE fica em uma área cinzenta de interpretação, o que acaba por afastar a sua aplicação no Brasil em larga escala até o momento.

O que são Convertible Notes (ou Nota Conversível)?

As Convertible Notes, ou em português “notas conversíveis”, são uma modalidade de investimento, semelhante a uma nota promissória, que representa um empréstimo de um investidor para uma startup.

Basicamente, é um tipo de dívida que pode ser convertido em percentual de participação societária na startup investida, quando ela atingir determinado marco acordado, como realização de novas rodadas de investimentos.

As Convertible Notes possuem quatro cláusulas essenciais:

(1) Definição da taxa de juros (“interest rate”);

(2) Data de vencimento (“maturity date”) da nota, ou seja, momento em que a startup deve reembolsar o investidor;

(3) Taxa de desconto (“discount”), que serve para compensar o investidor pelo risco assumido, sendo geralmente de 20% (vinte por cento) de desconto no valor da ação da empresa;

(4) Valuation Cap, que estabelece o preço máximo pelo qual uma Convertible Note será convertida em ações.

Embora nos Estados Unidos as Convertible Notes sejam instrumentos simples e céleres, aqui no Brasil, em razão das especificidades da nossa legislação e mercado, o processo é mais complexo e demorado, implicando em uma adaptação com mais obrigações acessórias e cláusulas longamente discutidas para conseguir trazer mais segurança jurídica para as partes.

Por isso, visando atender a legislação brasileira, foi criado o Mútuo Conversível, que é a versão brasileira das Convertible Notes americanas.

Principais pontos de atenção para startups em relação a essas formas de investimento:

O SAFE e as Convertible Notes, por serem documentos criados nos Estados Unidos, não possuem ainda aplicação jurídica no Brasil, entretanto, podem ser utilizados por startups que estão sediadas no exterior, mas com subsidiária no Brasil.

O SAFE ainda não está sujeito à legislação brasileira, pois ainda não existe uma versão desenvolvida levando em consideração a nossa jurisdição. Porém, conforme citamos no tópico anterior, as Convertible Notes já foram adaptadas para a realidade brasileira por meio do contrato de Mútuo Conversível.

Conclusão:

Por serem documentos pouco utilizados no Brasil, mas amplamente propostos por investidores e fundos de venture capital estrangeiros à startups brasileiras, entendemos que podem existir  condições e cláusulas não tão claras para o empreendedor. Por isso é de extrema importância o acompanhamento por advogados especialistas em investimentos em startups, que entendam seu universo, para auxiliá-lo na formalização do aporte, dadas as particularidades que esses mecanismos possuem.

Por Jéssica Del Sant