No atual cenário econômico, marcado pelo crescimento do setor tecnológico e pelo sistema nacional de startups e fintechs, surgiu uma nova forma de operação societária ainda pouco difundida no Brasil, a aquisição de empresas com foco no capital humano, também conhecida como "acqui-hiring" ou “aquisição para contratação de pessoas”. Nessa transação, a principal motivação da empresa adquirente é a aquisição de talentos e profissionais, e não apenas os produtos, serviços, ativos ou posição no mercado. Com isso, percebe-se que o estímulo essencial da operação é agregar valor à companhia-adquirente através das habilidades e competências desses profissionais.
Inquestionavelmente, o setor de inovação e tecnologia atravessa um período próspero. Na sociedade atual, interconectada, desafiadora e veloz, a demanda por produtos e serviços que ofereçam soluções criativas e ágeis cresce exponencialmente, inclusive por grandes empresas que passaram a buscar nas startups soluções para problemas internos.
As startups são empresas nascentes ou em operação recente, que detectaram oportunidades e soluções no mercado, cuja atuação se caracteriza pela inovação aplicada ao modelo de negócio ou aos produtos e serviços ofertados, o que, por sua vez, demanda que possua em seu time profissionais altamente qualificados.
Acontece que esses talentos, por estarem comprometidos com o sucesso das startups que já possuem uma relação negocial prévia, seja como sócio, como colaborador ou prestador de serviço, acabam por não estar disponíveis às vagas do mercado – apesar da grande demanda por mão-de-obra qualificada –, isso porque é mais comum que optem por permanecer nessa startup que já tem um vínculo do que aceitar contratos com grandes companhias. Diante desse cenário, as gigantes do mercado, interessadas em adquirir o capital humano qualificado, deixaram de buscar os profissionais de forma isolada e passaram a mirar a aquisição das próprias startups em que trabalham, adquirindo não só a empresa, mas, principalmente, os talentos que ali estão.
E onde que entra a importância do Direito do Trabalho nisso tudo?
Na maioria das vezes, o advogado trabalhista em tais operações começa com uma auditoria legal (“due diligence”) na empresa a ser adquirida. Isso é feito para analisar eventual passivo trabalhista, que pode impactar o valor da transação, as garantias envolvidas, os riscos e até mesmo a viabilidade do negócio.
No mais, após a conclusão das auditorias iniciais, é comum que surjam dúvidas relacionadas à formação de grupo econômico, sucessão de empregados e disparidade nos benefícios oferecidos aos funcionários da empresa adquirida e da adquirente, questões essas que exigem a orientação de um profissional especializado em direito do trabalho.
Também é preciso lembrar que o intuito dessa operação, conforme mencionado anteriormente, está na aquisição do capital humano, sejam sócios, empregados ou prestadores de serviços autônomos que constituem o time da empresa adquirida. E é por isso que, para evitar certa frustração por parte da equipe, compete aos profissionais especializados em direito do trabalho encontrar formas de manter os empregados na empresa durante a após a conclusão da operação de aquisição, sendo uma das soluções viáveis o denominado bônus de retenção.
O bônus de retenção, muito embora se trate de uma parcela não tipificada na legislação trabalhista brasileira, corresponde a um valor oferecido para recompensar o empregado que se compromete a permanecer no emprego por um determinado período, podendo ser utilizado como um meio de evitar a perda de profissionais, tornando-se um atrativo para a sua permanência na companhia, especialmente no caso de colaboradores altamente valiosos para o mercado.
Como visto, uma operação que tem como principal objetivo a aquisição de profissionais altamente qualificados certamente envolverá questões de natureza trabalhista relevantes para o sucesso da transação. Nesse sentido, a utilização de instrumentos trabalhistas para alcançar o objetivo pretendido é essencial, motivo pelo qual é fundamental que todo o processo seja acompanhado por múltiplos profissionais do direito, cada um em sua área, o que inclui e dá destaque à área trabalhista, que passa a ser elemento fundamental na composição da viabilidade do "acqui-hiring".
Por Caio de Paula Nunes