Vários estabelecimentos comerciais condicionam a venda de seus produtos ao pagamento de um valor mínimo de consumação por parte dos clientes. Esta prática é por vezes explicita em aplicativos de delivery, e-commerces e marketplaces, mas também acontece em estabelecimentos físicos, como bares e restaurantes. No entanto, apesar de ser comum, esta atividade é vedada pela Lei n° 8.078/90, mais popularmente conhecida como Código de Defesa do Consumidor (CDC).
O CDC é bem preciso sobre o tema em seu art. 39, mais especificamente nos incisos I e V, ao estabelecer que:
“Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas:
I – condicionar o fornecimento de produto ou de serviço ao fornecimento de outro produto ou serviço, bem como, sem justa causa, a limites quantitativos;
(...)
V - exigir do consumidor vantagem manifestamente excessiva;”
Basicamente, o CDC tenta resguardar que todas as compras devem ser tratadas com igualdade pelo vendedor, independentemente do valor ou quem está comprando. Além disso, também busca proteger o consumidor quanto a venda casada, visto que ao condicionar o cliente a comprar produtos, desde que pague por um valor mínimo, o estabelecimento está induzindo o cliente a comprar outros produtos apenas para atingir o exigido. O CDC também determina que se trata de exigência de vantagem manifestamente excessiva, posto que o cliente é obrigado a dispor de quantias que, por vezes, não tem condições ou ainda que tenha, não está disposto a fazer, uma vez que pela boa prática o cliente só deve ser obrigado a pagar pelo que de fato tem o desejo de consumir.
Assim, o consumidor tem a prerrogativa de denunciar o estabelecimento comercial perante os órgãos competentes, como a Procuradoria de Proteção e Defesa do Consumidor (PROCON), a Associação Nacional do Ministério Público do Consumidor (MPCON) ou até mesmo ingressar com demanda judicial com o objetivo de obter a reparação do dano sofrido.
Na hipótese de descumprimento desta obrigação legal por parte do fornecedor, o CDC determina uma série de penalidades que estão previstas nos artigos 56 a 60, e que vão desde multa e apreensão de produtos até interdição, total ou parcial, do estabelecimento.
Além das disposições contidas no CDC, alguns estados brasileiros possuem leis próprias que vedam a exigência de valor mínimo, especialmente para compras realizadas por cartão de crédito ou débito. A exemplo disso temos a Lei nº 19.590/2017 do estado de Goiás e a Lei nº 11.886/05 do estado de São Paulo.
Alguns estabelecimentos comerciais justificam que a exigência de uma quantia mínima de consumação se dá pelas altas taxas que devem ser repassadas para as administradoras de cartões ou para emissão de boletos. Contudo, os Órgãos de Defesa do Consumidor fundamentam que se o estabelecimento opta por aceitar pagamentos com cartões ou boletos já deve calcular e incluir as taxas previamente, não podendo impor valores mínimos.
Não obstante, como estratégia para que os estabelecimentos respeitem a legislação ao não exigir uma consumação mínima e, ao mesmo tempo, não saiam no prejuízo, vale mencionar que a Lei nº 13.455/17 possibilita a cobrança diferenciada de valores de produtos ou serviços, de acordo com a forma de pagamento escolhida pelo consumidor.
Deste modo, caso o cliente opte por pagar por cartão de crédito, por exemplo, poderá ocorrer um acréscimo no valor na compra, já que existem as despesas administrativas que são cobradas quando os pagamentos são efetuados com cartões de crédito, débito, boleto ou cheque, ao passo que, caso o cliente opte pelo pagamento em dinheiro, poderá receber um desconto:
“Art. 1º Fica autorizada a diferenciação de preços de bens e serviços oferecidos ao público em função do prazo ou do instrumento de pagamento utilizado.
(...)
Art. 5º-A. O fornecedor deve informar, em local e formato visíveis ao consumidor, eventuais descontos oferecidos em função do prazo ou do instrumento de pagamento utilizado.
Parágrafo único. Aplicam-se às infrações a este artigo as sanções previstas na Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990 .”
Assim, a lei autoriza a diferenciação de valores a depender da forma de pagamento, mas estabelece que é dever do fornecedor informar ao consumidor, o que pode ser feito mediante a colocação de avisos em locais que sejam visíveis e de fácil acesso, como nos termos de uso, no anúncio do produto, no carrinho e no momento da conclusão da compra, contendo quais são os percentuais oferecidos pelo estabelecimento, de acordo com a forma de pagamento e os prazos escolhidos pelo cliente.
Vale ressaltar que a permissão existe, mas a diferença de valor deve ser sempre baseada na real necessidade e na razoabilidade. Isso porque, cobrar preços muito diferenciados devido à forma de pagamento para obter um lucro alto, por exemplo, também pode ser considerada conduta abusiva pela legislação consumerista.
Uma outra opção para engajamento de vendas, sem que seja considerada conduta abusiva, é o oferecimento de benefícios ao cliente para motivá-lo a comprar mais, como é o caso dos cupons de desconto na compra ou no frete. Assim, o fornecedor não infringe a legislação obrigando que mais itens sejam adquiridos pelo cliente, mas ao mesmo tempo cria mecanismos para motivar o cliente a fazer compras maiores.
Estas são breves alternativas que o estabelecimento comercial pode optar para que se mantenha em acordo com a legislação e melhore seus rendimentos sem prejudicar o consumidor. Nesse sentido, caso você tenha dúvidas e queira seguir as melhores práticas legais sobre o tema, sugerimos fortemente que procure uma equipe especializada que possa auxiliá-lo.
Por Jéssica Ribeiro