Como já tratado em nosso artigo anterior, os marketplaces funcionam como espécies de shoppings virtuais, utilizados para que vendedores possam ofertar e comercializar seus produtos e serviços na internet. Por essa razão, tendem a circular uma grande quantia em dinheiro proveniente dos pagamentos efetuados na plataforma. Entretanto, a maior parte dos valores não pertence aos comércios eletrônicos, já que os marketplaces trabalham apenas como intermediários.
Em termos práticos, basta observar o caso do Mercado Livre. Suponhamos que um vendedor anuncie um celular por R$3.000,00 e um cliente interessado faça a compra pela plataforma. A empresa receberá R$3.000,00 pela transação, mas reterá apenas uma porcentagem desse valor pelo serviço prestado. Hipoteticamente, se considerássemos que a comissão nesse caso é de 10% do valor total, o marketplace teria como receita apenas R$300,00 e os R$2.700,00 restantes seriam repassados ao vendedor.
Toda essa circulação de dinheiro de terceiros chamou a atenção do Banco Central do Brasil (BACEN), responsável por regular e supervisionar o Sistema Financeiro Nacional, as instituições financeiras e a circulação de moeda, que passou a publicar entendimentos sobre o tema. Especificamente a respeito da adequação dos marketplaces, a Circular nº 3.682 de 04 de novembro de 2013 trouxe mudanças bastante significativas para esse tipo de negócio.
Além de comércios virtuais, os marketplaces foram considerados pelo BACEN como empresas intermediadoras de pagamento, responsáveis pela custódia de valores pertencentes a outras pessoas e deixando de serem vistos apenas como destinatários finais. Por isso, as regras da Circular nº 3.682, que antes eram aplicáveis apenas a instituições financeiras, foram estendidas a alguns marketplaces, que passaram a se integrar ao arranjo de pagamento. O arranjo de pagamento é o conjunto de normas e procedimentos que cuida da prestação de serviço de pagamento ao público, com acesso direto pelos usuários finais, pagadores e recebedores. O objetivo é centralizar a liquidação de pagamentos em todo o país, além de afastar os riscos desses comércios que recebem a vista, mas entregam o produto/serviço a prazo.
Resumindo, quais foram as mudanças?
- Atualmente qualquer estabelecimento comercial, seja físico ou eletrônico, que deseja receber valores por cartões pode contratar adquirentes (membros licenciados pela bandeira de cartão que aceitam estabelecimentos em seu programa de transações financeiras, comunicando com os bancos, as bandeiras e as lojas, como é o caso da Cielo e a Rede) ou subadquirentes (pessoas jurídicas que fazem a intermediação dos pagamentos entre todas as partes envolvidas, sendo responsáveis por transportar os dados da transação ao adquirente e liquidar os recebíveis junto aos lojistas, como é a PagSeguro e Paypal), sem a necessidade de formalizar uma relação diretamente com as bandeiras de cartão;
- A partir da mudança, alguns marketplaces são compreendidos como “subcredenciadores”, ou seja, se tornam responsáveis por valores de outras pessoas, sendo parte do processo de arranjo de pagamento e não sendo vistos como destinatários finais, motivo pelo qual devem formalizar a participação, serem fiscalizados e estarem integrados à Câmara Interbancária de Pagamentos (CIP);
- Assim, é necessário que essas empresas passem a aderir à liquidação centralizada por meio da CIP, deixando de realizar as transações diretamente no marketplace;
- Consequentemente a gestão tecnológica deve se tornar mais avançada;
- É importante contar com um time que consiga realizar todo o trabalho formal e burocrático imposto pelas normas;
- É preciso ter uma pessoa jurídica formalmente constituída;
- São exigidos mecanismos de governança efetivos e transparentes de modo a contemplar os interesses dos participantes e dos usuários finais (Temos um e-book sobre Compliance e Governança, caso tenha interesse em baixá-lo, clique aqui);
Uma boa opção para as startups em fase de desenvolvimento é terceirizar a gestão de pagamentos, utilizando outros intermediadores para receberem e dividirem as quantias, desde que esses terceiros também estejam em conformidade com o que dita o BACEN. Nossa indicação é que todos os empreendedores do segmento fiquem atentos, já que, embora o BACEN tenha começado esse processo com grandes empresas, claramente o Estado está buscando regular e normatizar esse tipo de atividade.
Por Natália Martins Nunes