A Medida Provisória (MP) 1.182 publicada no dia 25 de julho de 2023 tem como objetivo trazer alterações na Lei 13.756/2018, trazendo uma nova regulamentação para a exploração de apostas esportivas de quota fixa (“bets”).
De acordo com a Câmara, o objetivo é formalizar uma área de interesse público, garantindo mais segurança aos apostadores, além de trazer uma nova fonte de Receita ao Estado.
Inicialmente, é importante delimitar que podem solicitar autorização para exploração das loterias de apostas de quota fixa as pessoas jurídicas nacionais e estrangeiras que são estabelecidas no Brasil e que atendam às exigências do Ministério da Fazenda, que é o órgão responsável pela regulamentação da atividade, de acordo com o art. 29, §2º e §4º da referida MP.
Nesse contexto, o Ministério da Fazenda poderá requisitar informações técnicas, operacionais, econômico-financeiras e contábeis, além de dados, documentos, certificados, certidões e relatórios relativos às atividades desenvolvidas, garantindo que haverá o sigilo legal e a proteção de dados pessoais das informações recebidas, se necessário.
Ainda, haverá uma taxa de fiscalização mensal que deverá ser paga pelas pessoas jurídicas que explorem a loteria de quota fixa, conforme estabelece o art. 27 da MP.
Pontua-se que, apesar da MP ter sido publicada, diversos pontos ainda serão discutidos no Congresso e dependem de normatização perante o Ministério da Fazenda.
Quais são os principais pontos que a MP trouxe com relação ao Compliance?
No que concerne ao Compliance, no art. 33, §1º a MP dispõe que o operador de loteria de quota fixa deverá desenvolver ações informativas com relação a conscientização dos apostadores e de prevenção de transtorno do jogo patológico. Visto isso, a elaboração do Código de Ética e de Políticas Corporativas voltadas às boas práticas serão indispensáveis para a conformidade com essa disposição.
Ainda, o art. 33-C traz vedações quanto a participação, seja ela direta ou indireta, dos sócios e/ou acionistas da empresa operadora de loteria de apostas de quota fixa em Sociedade Anônima do Futebol, em organização esportiva profissional, ou em atuação como dirigente de equipe desportiva brasileira.
A MP, através do art. 35-E, proíbe também algumas pessoas de participar de apostas esportivas, como é o caso de: i) menores de 18 anos; ii) dirigentes das empresas de apostas; iii) agentes públicos que sejam responsáveis pela regulação e/ou fiscalização dessa atividade; iv) pessoa que tenha ou possa ter acesso aos sistemas informatizados de loteria de apostas de quota fixa; v) pessoas que tenham influência no resultado do evento, como por exemplo o dirigente esportivo, atletas e árbitros; vi) inscritos nos cadastros nacionais de proteção ao crédito. Nos casos elencados nos itens i, iv e v, a proibição se estende aos cônjuges, companheiros e parentes até segundo grau.
Esses pontos indicam a necessidade de se estabelecer um procedimento de due diligence (devida diligência) bem estruturado, com a capacidade de, através da validação de dados, verificar se o potencial apostador se enquadra em uma dessas vedações trazidas pela MP. Para tanto, é imprescindível haver um Programa de Compliance bem detalhado, com procedimentos e monitoramento eficazes.
Nesse sentido, uma das principais Políticas que dará publicidade a este procedimento e monitoramento das empresas que promovem essas apostas, é a Política de Know Your Customer (Conheça seu Cliente).
No mais, no art. 33-D, a MP exige que o agente operador adote mecanismos de segurança e integridade na realização do serviço prestado, observando a regulamentação do Ministério da Fazenda, bem como a Lei 13.709/2018, a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD). Visto isso, o compliance digital é um passo indispensável para estar em conformidade com o atualmente exigido.
Vale ressaltar que o prazo de reporte de eventos suspeitos de manipulação ao Ministério da Fazenda é de 5 (cinco) dias úteis contados a partir do conhecimento do evento suspeito. Visto isso, os procedimentos de monitoramento e reporte deverão estar em consonância com esse prazo estipulado para que não haja o risco de um reporte intempestivo, que pode causar consequências negativas à empresa.
Outro ponto importante é que o art. 35 da Lei 13.756/2018 dispõe que àquelas Pessoas Jurídicas autorizadas a realizar as atividades mencionadas devem remeter informações sobre prevenção à lavagem de dinheiro e financiamento do terrorismo ao Conselho de Atividades Financeiras (COAF).
Visto isso, é imprescindível que essas empresas tenham mecanismos internos que visam a prevenção à lavagem de dinheiro e financiamento do terrorismo, especialmente procedimentos apurados de monitoramento das transações.
Como adequar a empresa?
Explorando de forma objetiva sob a ótica do Compliance, um dos objetivos da MP é exigir pontos chaves para mitigar os riscos de eventos negativos oriundos dessa atividade corporativa no mercado, e, sobretudo, de forma efetiva. Por isso elencamos aqui alguns requisitos e medidas esperadas das startups nesse sentido.
Inicialmente, a empresa deve ter um Programa de Compliance efetivo com base na realidade interna e operacional, e até mesmo no tamanho e dimensão dos negócios. Nesse artigo ensinamos como implementar um Programa de Compliance na sua startup.
É importante ressaltar que um dos principais passos da estruturação de um Programa de Compliance efetivo é o Mapeamento de Riscos. Com esse mapeamento serão identificados quais os principais riscos que incidem sobre a operação da empresa, os setores e procedimentos envolvidos, se já existem mecanismos implementados para mitigar esses riscos, e, por fim haverá a identificação de quais medidas mitigatórias devem ser tomadas, bem como quais Políticas deverão documentar esses procedimentos.
Todavia, observando especificamente a MP 1182/2023, para que esse Programa de Compliance esteja em maior conformidade com as atualizações dispostas pela referida lei é indicado que haja ao menos as seguintes Políticas e/ou procedimentos:
- Código de Conduta: Documento que reúne os princípios e valores adotados pela empresa, com condutas esperadas dos stakeholders, sendo importante dispor nesse caso em específico sobre conflito de interesses.
- Políticas de Know Your (Due Diligence de Terceiros): Políticas voltadas a documentar procedimentos de “Conheça Seu” Cliente, Parceiro, Fornecedor e Colaborador. Essas Políticas descrevem como ocorre a devida diligência da empresa no momento prévio ao estabelecimento de uma relação negocial, e como ocorre o monitoramento após o relacionamento ser estabelecido.
- Política Anticorrupção: Estabelece princípios, diretrizes e procedimentos a serem aplicados por todos da empresa, voltados a prevenir o cometimento de atos lesivos contra a administração pública nacional e estrangeira.
- Política de Integridade Esportiva: Política para especificar condutas realizadas pela empresa com o objetivo de contribuir com a pauta de conscientização dos apostadores, prevenção do transtorno do jogo patológico, bem como divulgação das boas práticas realizadas pela empresa, especialmente no que concerne à integridade no âmbito esportivo.
- Monitoramento e Reporte de Operações Suspeitas: Procedimentos que são aplicados para identificar e contemplar operações e situações que possam indicar suspeitas de utilização dos produtos e serviços da empresa para a prática de lavagem de dinheiro e financiamento do terrorismo.
- Avaliação Interna de Risco: Avaliação com o objetivo de identificar e mensurar os riscos da utilização dos produtos e serviços da empresa para a prática de lavagem de dinheiro, e financiamento do terrorismo.
- Política de Prevenção à Lavagem de Dinheiro e Financiamento do Terrorismo: Política que dispõe sobre os procedimentos adotados pela empresa no combate à lavagem de dinheiro, financiamento do terrorismo, bem como estabelecimento de reporte ao COAF de operações suspeitas.
Essas Políticas e/ou procedimentos trazem a regulação de pontos exigidos pela referida MP e, por isso, sugere-se que as empresas que estejam sujeitas a essas regulações, implementem esses pontos.
Conclusão
Destarte, para que sua startup esteja em conformidade com a MP 1.182/2023 é imprescindível a adequação às exigências relacionadas ao Compliance que são elencadas na referida lei.
Para tanto, ter um Programa de Compliance estruturado em consonância com a realidade interna da empresa é muito importante, e estabelecer procedimentos complementares para estar de acordo com o que a lei pede é o ideal nesse momento inicial.
Ainda, outro ponto importante é que haverá novas regulações para complementar a referida MP, e o Setor de Compliance da sua empresa deve estar sempre atento com as atualizações regulatórias e de mercado para adequar os procedimentos internos com eficácia e conformidade.
Diante do exposto, para que a sua startup esteja em conformidade com a MP 1.182/2023 e os demais regramentos que trazem direcionamentos quanto ao Compliance, é fundamental que esteja acompanhada de uma assessoria jurídica especializada, a qual será responsável por adequar e acompanhar a empresa nesse caminho.
Por Letícia Faccio