ICO – Initial Coin Offering: Uma análise jurídica geral

A ICO é a nova forma de uma startup buscar financiamento no mercado digital. Pensando nisso elaboramos um resumo sério do que seria a ICO — Initial Coin Offering, sob um olhar mais direto a respeito de sua razão de existir, prós, contras e como isso têm sido encarado no Brasil de hoje.

  • Disclaimer #1: Todo material que utilizamos para embasar o texto está citado ao final.
  • Disclaimer #2: Não vamos abordar o que é blockchain por aqui, ok? Para entender mais sobre o assunto, indicamos fortemente ler esses dois ótimos materiais aqui aqui.
  • Disclaimer #3: Com certeza vão ter pontos de discussão. O objetivo é fazer um apanhado geral e não entrar em pormenores ou discutir questões atreladas a criptomoedas. Faremos um novo texto sobre esses tópicos.

De onde veio/Para que serve a ICO?

Em resumo, ICO é a oferta de tokens/coins criados por empresas em troca de valores financeiros, geralmente baseados em bitcoin/ethereum.

A CVM define ICO como as captações públicas de recursos, tendo como contrapartida a emissão de ativos virtuais, também conhecidos como  tokens ou  coins, junto ao público investidor.

A ICO pode ser encarada como uma "evolução" do modelo de captação de investimento tradicional.

Em um primeiro momento, existia apenas o formato de captação de investimento por investidores, VC's, Angels, e outros, através de contratos de investimento, AFAC e Mútuo Conversível, por exemplo.

Em seguida, começaram a surgir plataformas que pulverizam a busca de investimento para diversos investidores, chamado de equity crowdfunding. As duas grandes referências que tenho para citar do Brasil seriam Broota Startmeup.

Por fim, com o crescimento do blockchain e de suas ramificações, surge a Initial Coin Offering, espécie de oferta pública, mas diferente e menos "difícil" do que o modelo tradicional de IPO que vemos em uma Bolsa de Valores.

Dessa forma, deve estar claro que o objetivo da ICO é o mesmo dos outros meios de captação supracitados: levantar capital para que a empresa possa começar a operar/escalar/sobreviver/e outros…

A partir dessas ofertas a empresa consegue:

  • #1 : Oportunidade maior de capital pela pulverização do investimento.
  • #2: Menos burocracia/mais agilidade do que em casos tradicionais de IPO.
  • #3: Personalização dos direitos ofertados a cada perfil de investidor.

Ok. Agora vamos analisar o que são os mecanismos criados para que a captação de valores seja possível.

O que são Tokens/Coins?

São instrumentos, criados a partir da tecnologia do blockchain, e que definem aos seus detentores benefícios específicos. Em uma analogia, os tokens se assemelham muito às ações preferencias de uma S.A. tradicional.

Os benefícios ofertados em cada coin são definidos pela empresa que as oferece e geralmente vêm descrito em um documento específico disponibilizado a todos os possíveis investidores.

Na prática, cada ICO terá benefícios distintos, definidos pelos interessados em captar e voltados especificamente para o cenário econômico/atividade empresarial do negócio.

Aqui vale um destaque rápido, pois existem duas definições de token:

  • O primeiro é aquele que prevê um retorno financeiro, bastante parecido com o modelo de ações preferencias. Pode prever, por exemplo, o direito do investidor que adquirir o token receber lucros da empresa primeiro que os demais.
  • O outro modelo oferta benefícios vinculados ao negócio, ou seja, utilidades. Por exemplo, o investidor poderia utilizar os serviços da empresa investida gratuitamente ou então teria direito de fazer divulgação que lhe interesse aos clientes da investida.

Agora vamos para a aplicação prática de uma ICO e o cenário no Brasil.

ICO na prática: possível no Brasil?

Hoje o que tem se observado nos casos mais comuns de ICO fora do país é a contratação de uma plataforma que gerencia essa oferta para a a empresa/startup que cede os tokens/coins.

Para conhecimento,  clique aqui para ler sobre um caso de ICO recente e que levantou mais de USD 37 Milhões.

Em paralelo, a empresa elabora um documento especificando a oferta aos possíveis investidores e delimitando questões básicas que estarão inseridas em cada um dos tokesn/coins, tais como valores mínimos, prazos de pagamento, payback, e outros pontos que julgar relevante para seu mercado.

Ainda, é natural que as empresas criem também uma página específica para anunciar essa ICO, a fim de garantir um contato direto com todos os interessados por um só meio de comunicação.

Por fim, seguindo esse passo-a-passo, a empresa começa a comercializar os tokens/coins com os investidores interessados.

Contudo, esse é o cenário internacional. No Brasil, a legislação inexiste, apenas uma orientação recente da CVM que você pode ler aqui e também aqui.

Em resumo, a Comissão de Valores Mobiliários se manifestou dizendo que

As ofertas de ativos virtuais que se enquadrem na definição de valor mobiliário e estejam em desconformidade com a regulamentação serão tidas como irregulares e, como tais, estarão sujeitas às sanções e penalidades aplicáveis.  A CVM alerta que, até a presente data, não foi registrada nem dispensada de registro nenhuma oferta de ICO no Brasil.

Portanto, o que se depreende do posicionamento mais recente é que a CVM não proíbe a oferta de toda e qualquer ICO no Brasil, somente aquelas que ofertem valores mobiliários, reforçando assim a importância de se definir de forma clara quais as condições da oferta e quais os direitos dispostos em cada token/coin ofertado ao mercado.

Ainda não vimos nenhuma caso de oferta pública no modelo de ICO no Brasil, talvez pelo receio da mão do Estado, talvez pela inexperiência do mercado ou até mesmo pela dificuldade de encontrar tecnologia capaz de fazer o serviço de forma segura e prática por aqui.

De qualquer forma, nota-se que esse tipo de demanda tem crescido, provavelmente impulsionada pelo mercado de criptomoedas em todo o mundo e que indubitavelmente teremos casos de oferta desse tipo de "moeda" no Brasil em breve.

Por último, é pertinente analisar os principais cuidados de quem pensa em investir em ICO.

Investidor, cuidado com a bolha?

Uma vez compreendidos os principais pontos de toda essa odisseia sobre ICO, vale elencar quais os principais cuidados que um investidor deve ter ao buscar esse tipo de investimento:

  • #1: Quais as os direitos previstos nos tokens/coins.
  • #2: Existe algum tipo de cláusula temporal vinculada à oferta ou condição especial?
  • #3: Quem está intermediando a transação é confiável? O protocolo em si é confiável?
  • #4: Qual o modelo de negócio da startup? Os objetivos definidos para a captação parecem factíveis?
  • #5: Existe algum outro Investidor experiente que esteja posicionado como Investidor-líder para trazer maior confiabilidade à oferta?

Esses pontos devem ser analisados em qualquer tipo de ICO que alguém tenha interesse, pois o que se tem observado é um mercado muito aquecido e um excesso de oferta com pedidos pautados em criptmoedas como o bitcoin que passam por alta volatilidade, por exemplo.

Isso pode, em um cenário hipotético, elevar o valuation em uma ICO de forma muito perigosa, não só para os investidores, mas também para os próprios investidos que talvez não consigam cumprir o que se propuseram no ato da oferta.

Nesse sentido, os riscos de uma ICO estão vinculados à todos.

Por fim

Exposto todos os pontos e agentes envolvidos em uma ICO, como funciona na prática, qual o posicionamento atual no Brasil e os principais itens de cuidado daqueles que pensam em investir, resta claro que essas ofertas públicas de tokens/coins não são simples.

Todavia, o objetivo aqui era apenas explicar o que é de fato uma ICO e acredito que está feito. Esperamos ter conseguido ser claro em todos os pontos e, caso tenha qualquer dúvida sobre essa e quaisquer outras formas de buscar captação de investimento para seu negócio ou para investir em negócios de terceiros, não deixe de procurar um profissional de sua confiança.

*Material de apoio:

https://www.youtube.com/watch?v=toekAsw6MCA https://www.youtube.com/watch?v=c2Gf_PHk530 http://www.cvm.gov.br/noticias/arquivos/2017/20171011-1.html https://medium.com/@arnaudsaintpaul/what-is-an-ico-or-initial-coin-offering-1bd22e318cdf https://hackernoon.com/wtf-is-an-initial-coin-offering-ico-8b03b18b0bd0 https://hackernoon.com/hack-your-funding-with-an-initial-coin-offering-2a2a0614bddf https://blog.usejournal.com/guide-to-launching-an-initial-coin-offering-ico-94587af2c8d5 https://medium.com/mit-technology-review/what-the-hell-is-an-initial-coin-offering-1f54e4c6556d https://medium.com/vers%C3%A3o-txt/cvm-e-ico-initial-coin-offering-ed739a22c69d

Por Luiz Eduardo Duarte